O PAPA PECADOR
Dom Fernando Arêas
Rifan*
Houve quem ficasse surpreso quando, na
audiência geral de 29 de maio passado, o Papa Francisco declarou que era
pecador: “A Igreja é a grande família dos filhos de Deus.
Sem dúvida, ela também tem aspectos humanos; naqueles que a compõem, Pastores e
fiéis, existem defeitos, imperfeições e pecados; até o Papa os tem, e tem
tantos, mas é bom saber que quando nos damos conta que somos pecadores,
encontramos a misericórdia de Deus, que perdoa sempre”.
O Papa
Francisco quer nos ensinar a humildade, que começa com a confissão de que somos
pecadores. Ele é o vigário de Jesus Cristo na terra. Jesus, sendo Deus
santíssimo, tomou sobre si os nossos pecados: “Aquele que não cometeu pecado,
Deus o fez pecado por nós, para que nele nós nos tornássemos justiça de Deus (2
Cor 5, 21). Jesus, inocente e puro, quis passar por
pecador. Foi assim que ele juntou-se ao povo para receber o batismo de
penitência dado por João no rio Jordão. Nós, ao invés, sendo pecadores,
queremos passar por santos. E ficamos indignados quando somos tratados como
pecadores! “Se dissermos que não temos pecado, estamos enganando a nós mesmos,
e a verdade não está em nós” (1Jo 1, 8).
Por isso a
Igreja, mãe sábia, na sua sagrada Liturgia, nos ensina sempre a humildade: “Eu,
pecador, me confesso... porque pequei muitas vezes..., por minha culpa, minha
culpa, minha tão grande culpa”; com muitas súplicas ao perdão e à misericórdia
de Deus: “não olheis os nossos pecados, mas a fé que anima a vossa Igreja”.
Subliminarmente,
o Papa também quer combater o carreirismo na própria Igreja, o gosto de
aparecer, o desejo de nos substituirmos a Jesus Cristo, o querer, na Liturgia,
por exemplo, se suplantar ao próprio Cristo, fazendo-nos os protagonistas da
ação sagrada.
“Sede
discípulos meus, porque sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso
para vós” (Mt 11, 29). A humildade é fonte de paz, de fraternidade e união. É o
oposto da hipocrisia. E para ser humilde é preciso ser forte, corajoso e
valente. É a temática jesuítica, muito cara ao nosso Papa: “Acusar a si mesmo
implica uma valentia pouco comum para abrir a porta a coisas desconhecidas e
deixar que os outros vejam além de minha aparência. É renunciar à maquiagem,
para que se manifeste a verdade. Na base do acusar a si mesmo, que é um meio,
está a opção fundamental pelo anti-individualismo, pelo espírito de família e
de Igreja que nos conduz a nos assumirmos, como bons filhos e bons irmãos, para
mais tarde podermos vir a ser bons pais. Acusar a si mesmo implica uma postura
basicamente comunitária...” E como ele falou na última audiência, o
reconhecermo-nos pecadores atrai o perdão de Deus: “Quem acusa a si mesmo abre
espaço para a misericórdia de Deus; é como o publicano que não ousa levantar
seus olhos (cf. Lc 18, 13). Quem sabe acusar a si mesmo é um homem que sempre
se aproximará bem dos outros, como o bom samaritano, e , nessa aproximação, o
próprio Cristo realizará o acesso ao irmão” (Jorge Mario Bergoglio, S.J., Sobre
a acusação de si mesmo).
*Bispo da
Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney